Se a gente desse um passo atrás no tempo, lá para os anos 80 ou 90, ia ver uma cena bem diferente da que temos hoje: vitrines lotadas, propagandas gritando “compre agora”, carrinhos cheios no supermercado, marcas tentando empurrar tudo que podiam para as mãos dos consumidores. O consumo era um símbolo de status, de sucesso. Quanto mais, melhor.
Só que o mundo mudou. E mudou muito.
Hoje, tem uma coisa acontecendo que está transformando o jeito como as pessoas se relacionam com as marcas: o consumidor não quer mais só um produto. Ele quer propósito. Quer saber para quê aquilo existe, que valores estão por trás daquela embalagem bonita. E, mais importante ainda: quer se sentir parte de algo maior.
Mas afinal, por que essa mudança tão profunda? Vamos conversar sobre isso.
O excesso cansa
Vamos começar com uma realidade que quase todo mundo sente, mas nem sempre percebe: a gente vive num mundo de excesso. Excesso de informações, de opções, de estímulos. Desde o momento que você acorda até a hora de dormir, é bombardeado com novidades, ofertas, notificações.
É roupa que nunca acaba nas lojas, é celular novo todo mês, é tendência que mal chegou e já ficou velha. E, no meio de tudo isso, vem a pergunta: eu realmente preciso de mais?
A resposta que muitos consumidores estão dando é: não.
Ter menos passou a ser mais confortável. Mais tranquilo. Mais consciente. E, nesse novo cenário, marcas que só vendem produto perdem espaço para aquelas que oferecem sentido, propósito e conexão.
A consciência pesa
Outro fator que vem moldando o comportamento do consumidor é a consciência.
Consciência ambiental, social, política. As pessoas começaram a entender o impacto das suas escolhas no mundo. Começaram a enxergar que cada compra é também um voto: um voto para o tipo de mundo que querem construir.
Se antes era normal consumir sem pensar nas consequências, hoje a história é outra. Muitos consumidores se perguntam:
Como essa empresa trata seus funcionários?
De onde vem a matéria-prima desse produto?
Essa marca respeita o meio ambiente?
Ela apoia causas sociais ou apenas finge?
E se a resposta não agradar… pode esquecer: o cliente vai embora, sem olhar para trás.
Pertencer a algo maior
Outra mudança poderosa é o desejo de pertencimento.
As pessoas não querem apenas usar uma marca; elas querem se sentir representadas por ela. Querem vestir uma camiseta e sentir que fazem parte de uma comunidade que acredita nas mesmas coisas. Querem consumir um produto e ter a certeza de que, com isso, estão ajudando a construir um futuro melhor.
Isso é especialmente forte nas gerações mais jovens, como a geração Z e os millennials. Para eles, o propósito não é um bônus — é o mínimo esperado.
Marcas que têm um propósito claro, verdadeiro e alinhado com os valores do público conquistam um espaço afetivo que nenhuma promoção ou propaganda agressiva é capaz de comprar.
O preço ainda importa, mas não é tudo
Claro que preço continua sendo importante. Ainda vivemos num mundo onde orçamento é uma preocupação real para a maioria das pessoas.
Mas veja: o consumidor de hoje não quer pagar menos a qualquer custo. Ele prefere pagar um pouco mais por algo que respeita o meio ambiente, que é feito de forma justa, que apoia uma causa na qual acredita.
O barato que sai caro — para o planeta, para a sociedade — perdeu o encanto.
É aí que entra o conceito de valor percebido: o consumidor não olha só o preço; ele olha o conjunto. Ele avalia o impacto da sua compra. E isso muda tudo.
Marcas que entenderam o recado
Algumas marcas já entenderam esse novo cenário e estão se destacando justamente porque oferecem muito mais do que um produto.
Pense na Patagonia, por exemplo. Mais do que vender roupas, a marca vende um compromisso com a preservação do planeta. Ela estimula seus clientes a consertarem peças antigas, a repensarem o consumo. Resultado? Criou uma legião de fãs apaixonados.
Ou a Ben & Jerry’s, que não é só um sorvete gostoso — é uma empresa que se posiciona politicamente, defende igualdade racial, direitos LGBTQIA+ e diversas causas sociais. E, por isso, conquista consumidores que se sentem representados por esses valores.
Esses exemplos mostram que o propósito é mais do que um discurso bonito. É uma prática diária, que deve estar presente em todas as ações da marca.
Não basta falar, tem que fazer
E aqui vem um ponto crucial: o consumidor percebe a diferença entre propósito verdadeiro e marketing de fachada.
Não adianta fazer uma campanha bonita no Dia da Terra se, no resto do ano, a empresa polui rios e florestas. Não adianta postar foto com bandeira de arco-íris no mês do orgulho se internamente a empresa discrimina seus funcionários LGBTQIA+.
O novo consumidor é atento, questionador, desconfiado. Ele pesquisa, investiga, compartilha informações. E ele pune — severamente — quem tenta enganá-lo.
Em outras palavras: propósito não pode ser estratégia de marketing; tem que ser alma da empresa.
A experiência importa (e muito)
Outra coisa que mudou é que a experiência passou a ser mais importante que o próprio produto.
Um café, hoje, não é só uma bebida. É o lugar onde você se sente acolhido, a história que está por trás dos grãos, a música que toca enquanto você toma seu espresso.
Uma peça de roupa não é só tecido; é a mensagem que ela carrega, a causa que apoia, o jeito como faz você se sentir.
As marcas que entregam uma experiência significativa conquistam não apenas clientes, mas embaixadores. Gente que fala delas com brilho nos olhos, que recomenda, que defende.
Menos quantidade, mais qualidade
Essa transformação também trouxe outra mudança: o foco na qualidade.
Se antes o objetivo era ter um armário abarrotado de roupas baratas, hoje muita gente prefere ter menos peças — mas que sejam duráveis, éticas, atemporais.
O mesmo vale para quase tudo: móveis, eletrônicos, cosméticos, alimentos.
O consumidor moderno quer produtos que tenham história, que durem, que sejam feitos com cuidado. E que tragam consigo um valor maior do que o mero ato de comprar.
O poder das histórias
Um dos jeitos mais potentes de conectar propósito e produto é através das histórias.
As pessoas se encantam por narrativas reais, emocionantes, autênticas. Querem saber quem fez aquele produto, como foi feito, que dificuldades foram enfrentadas, que sonhos estão por trás.
Contar histórias verdadeiras é uma forma poderosa de criar vínculo. E, no mundo atual, vínculo é a nova moeda mais valiosa para as marcas.
A crise acelerou tudo
A pandemia que o mundo enfrentou nos últimos anos também teve um papel importante nessa mudança de mentalidade.
O confinamento, a perda, a instabilidade… tudo isso fez as pessoas refletirem sobre o que realmente importa. Sobre o valor das relações, do cuidado com o outro, do impacto coletivo.
Muitos consumidores saíram dessa experiência transformados — e levaram essa transformação para suas escolhas de consumo.
Eles querem marcas que se importam. Que se posicionam. Que fazem a diferença.
Propósito como estratégia de futuro
Olhar para tudo isso é entender que o propósito não é só uma resposta às demandas do presente — é também uma estratégia de futuro.
Marcas que resistem em abraçar causas relevantes, que insistem em tratar o consumidor como mero comprador, que ignoram questões ambientais e sociais, estão cavando sua própria cova.
O futuro pertence a quem entende que lucro e impacto positivo podem (e devem) andar juntos.
Pertence a quem entende que vender um produto sem vender também uma ideia, um valor, uma esperança… não é mais suficiente.
Como as marcas podem agir?
Se você é empresário, empreendedor, ou trabalha em marketing, a pergunta que precisa se fazer é:
Que propósito genuíno minha marca pode defender?
A resposta não precisa ser grandiosa, nem salvar o mundo todo. Pode ser algo simples — mas precisa ser verdadeiro.
Algumas dicas:
Olhe para dentro: que valores já estão presentes na cultura da sua empresa?
Escute seu público: que causas emocionam seus clientes?
Seja coerente: não adianta defender algo em campanhas e fazer o oposto na prática.
Conte suas histórias: mostre o que faz, como faz, quem faz.
Seja transparente: admita erros, compartilhe acertos, mostre o caminho que está trilhando.
Menos consumo, mais conexão
No fim das contas, o que o novo consumidor quer é simples:
Menos acúmulo.
Menos desperdício.
Menos marketing vazio.
E mais:
Mais propósito.
Mais verdade.
Mais conexão.
O consumo deixou de ser apenas um ato econômico para se tornar um ato de identidade, de cidadania, de construção de futuro.
E, para as marcas, isso é um convite (e um desafio) para fazer diferente.
Quem entender isso primeiro, vai estar na frente.
Não é mais sobre vender por vender.
É sobre construir algo que valha a pena ser comprado, lembrado, vivido.
E então…
Qual é o propósito da sua marca?